INTRODUÇÃO
A
legislação brasileira traz em seu contexto muitas contradições que é
interessante observar. Dentro de cada
diploma legal encontramos contradições, equívocos, e, neste momento começo a expressar minha
perplexidade diante de determinados dispositivos legais que encontramos no
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
Em
primeiro lugar é essencial observar os princípios existentes no CÓDIGO DE
DEFESA DO CONSUMIDOR que Maria Helena Diniz em seu Dicionário Jurídico, possui vários significados, isto é, princípio
pode significar preceito, norma de conduta, máxima, opinião, maneira de ver,
parecer, código de boa conduta através do qual se dirigem as ações e a vida de
uma pessoa, é educação, doutrina dominante, alicerce, a base das normas que
regem uma sociedade.
Os princípios são
mandamentos superiores que inspiram a formação das normas jurídicas. Estas são
elaboradas respeitando os ditames dos princípios. Barros (2005, p.
213/214) em sua obra, diferencia o princípio, de uma norma jurídica, quando
explica: "O princípio lança sua força
sobre todo o ordenamento jurídico, atuando numa área muito mais ampla do que a
norma, pois esta se limita a regulares situações específicas".
Temos o Princípio da
Igualdade que é o equilíbrio nas relações de consumo, declarado nos vínculos
obrigacionais entre o fornecedor e o consumidor; o Princípio da liberdade de
escolha que é um direito básico do consumidor, tendo em vista diversos
dispositivos do CDC; Princípio da boa-fé, aquele que proíbe conteúdo desleal de
cláusula nos contratos sobre relações de consumo, impondo a nulidade do mesmo. Principio da harmonização
das relações de consumo – aquele que visa proteger o consumidor, evitando a
ruptura na harmonia das relações de consumo; Princípio da informação – o
consumidor tem de receber informação clara, precisa e verdadeira, usando a
boa-fé e lealdade; Princípio da transparência – a atividade ou mensagem publicitária devem
assegurar ao consumidor informações claras, corretas e precisas; Princípio da
veracidade – as informações ou mensagens ao consumidor devem ser verdadeiras,
com dados corretos sobre os elementos do bem ou serviço; Princípio da
vulnerabilidade do consumidor – aquele que, ante a fraqueza do consumidor no
mercado, requer que haja equilíbrio na relação contratual e outros.
Estes princípios são à base
do Direito do Consumidor, norteando as condutas e sanções aplicadas
relativamente aos consumidores bem como aos fornecedores nas relações de
consumo tendo como objetivo principal das normas de proteção e defesa do
consumidor, intervir nessas relações para defender uma das partes,
consubstanciadas nos princípios norteadores do Direito de Defesa do Consumidor.
Contudo, em muitos
dispositivos inseridos na legislação consumerista os Princípios deixam a
desejar, pois a própria legislação não esclarece o significado de expressões
que apenas os operadores do Direito tem instrumentos para decifrá-las.
Ora, se os Princípios são
supedâneos para a segurança do CDC tendo em vista a necessidade de proteção ao
consumidor, por que vislumbramos textos legais que nada esclarecem ao leigo ou
mesmo ao operador de direito que é obrigado a decifrar ou interpretar as
lacunas.
Cito um assunto que até hoje
estou procurando e se usa na prática, mas que na lei nada esclarece, como por
exemplo, no que diz respeito aos BANCOS DE DADOS e CADASTROS mencionados do
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
DOS BANCOS DE DADOS E
CADASTROS
1.
ACESSO AOS CADASTROS:
Ao deparar com o art. 43 do
Código de Defesa do Consumidor lemos o seguinte:
Art. 43. O consumidor, sem
prejuízo do disposto no art. 86, terá acesso às informações existentes em
cadastros, fichas, registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre
ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
2.
CADASTROS MÉDICOS E OUTROS
Em primeiro lugar, podemos
reparar no texto que o Consumidor terá acesso às informações existentes em
cadastros, fichas, registros e dados pessoais.
Neste caso a lei não informa
que CADASTROS são esses e podemos apenas entender que se a pessoa quiser ler o
seu cadastro médico ele terá pleno direito. Que CADASTRO é esse? Pode ser
diversos. A lei deveria especificar!
3.
CADASTROS DE CONSUMO
Na segunda parte do artigo
diz cadastros, fichas, registros e dados pessoais de CONSUMO. Mas, até agora
não vislumbrei nada que se falasse em inadimplência, pois conforme sabemos na
prática, se não pagar o débito, nosso nome vai para um setor e o nome ficará
sujo. Isso é prática.
Mas, pergunto: Alguém descobriu o que está escrito no art. 43?
Será que é o setor em que o nome fica ‘vulgarmente’ “sujo”?
Onde estão os princípios que
norteiam o CDC no momento em que devem primar pela clareza e
transparência? Se um leigo ou um operador
do direito ler só verá as palavras cadastros, bancos de dados, de alguém que
não é consumidor e alguém que tem um cadastro em algum lugar. Mas, que
cadastros são esses?
Posteriormente diz no § 2º do
art. 43.
A abertura de cadastro,
ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito
ao consumidor, quando não solicitada por ele.
Que abertura de CADASTRO? Na
prática, não seria quando o consumidor não paga em dia e o nome vai para a
SERASA e SPC? Por que a lei apresenta um quadro tão dissimulado?
Ora. Mais uma vez o operador
do direito tem que tentar enquadrar a prática à lei, e, tendo em vista o
conhecimento de que órgãos cadastrais prestam serviços ao comércio e aos
bancos, e controlam o crédito como se
espiões fossem, é que chegamos a conclusão de que este dispositivo legal de
abertura de cadastro só pode ser com relação, principalmente, à SERASA e o SPC.
Quando se fala em comunicar
ao consumidor, interpretando com a prática, é quando a SERASA e SPC são
obrigadas a enviar carta cientificando ao consumidor que ele tem um débito e
não pagando inserirá seu nome nos CADASTROS.
Muito interessante. Que CADASTRO?
A lei não diz... Quem é a SERASA e SPC para ter esse direito? O CDC diz no parágrafo 2º do art. 43 que o consumidor tem que ser centificado. Mas... por quem? Não prática : SERASA e SPC.
A SERASA foi criada em 1968
e os maiores acionistas são os Bancos e o SPC foi criado em 1955 e tem como
parceiros todo o comércio, e, atualmente Bancos e Comércio estão unidos,
deixando o consumidor entre a espada e a parede..
4. SERASA E SPC
O mais interessante é o §
4º do art. 43 - Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de
proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de "caráter público".
Neste dispositivo
o CDC enaltece os CADASTROS, BANCOS DE DADOS, considerando-os entidade de
"caráter público". Não são autarquias ou órgãos do governo como muitos pensam.
SERASA e SPC são entidades privadas e a
empresa irlandesa EXPERIAN em 2007 comprou o controle da Serasa - SERASA
EXPERIAN S/A. É uma empresa que fornece informações aos Bancos, às lojas do
comércio, às pequenas, médias e grandes empresas, com o objetivo de dar apoio
às decisões de crédito.
5. CORREÇÃO NOS CADASTROS
Já o § 3º descreve - O
consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus dados e cadastros, poderá
exigir sua imediata correção, devendo o arquivista, no prazo de 5 (cinco) dias
úteis, comunicar a alteração aos eventuais destinatários das informações incorretas.
Contudo, se o
consumidor paga uma dívida, ou se foi indevidamente para os CADASTROS, na prática o nome dele tem que
sair em 5 dias úteis. Mas, a lei não é clara. Existem projetos que pretende
esclarecer melhor este dispositivo.
6.
CADASTROS CLAROS E OBJETIVOS –
INFORMAÇÕES NEGATIVAS
Diante de todo o exposto, vislumbramos o §
1º -
Os cadastros e
dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem
de fácil compreensão, não podendo conter informações negativas referentes a
período superior a 5 (cinco) anos.
É interessante
observar que o CDC além de não esclarecer que CADASTROS são esses, prescreve
que devem ser claros, objetivos e mais ... não pode conter informações
referentes a período superior à 5 anos.
Digam-me. Que
informações são essas? Onde está a clareza e transparência que o CDC tanto
descreve em seu contexto? Informações negativas? O que pode ser?
Na prática
sabemos que seria a inserção nos órgãos CADASTRAIS, por que, também, na
“prática”, o consumidor está devendo. A LEI NÃO É CLARA.
Sabemos que na
realidade INFORMAÇÕES NEGATIVAS quer dizer "débito" e por isso o nome do
consumidor está nos CADASTROS e consequentemente o nome ficou “sujo”. Mas a lei
mais uma vez nada esclarece.
O que é estar
negativado? É ter dinheiro e estar devendo, ou é, estar devendo por não ter
dinheiro pelos juros extorsivos; ou se aquele produto que você comprou em
prestações de 60 meses já foi pago quatro vezes e você não aguenta mais. O
devedor comum não é desidioso, pois verdadeiramente o consumidor que tem seu nome nos CADASTROS
é aquele que está “sujo” por 10 reais ou não está suportando aqueles juros da
casa própria. Se esse consumidor aparece com muito dinheiro podem estar certos
de que ele já não estará mais nos CADASTROS.
Que controle é
esse que a SERASA e SPC realizam? Respondo. É para as empresas dinamizar o comércio e obter mais lucros. Não quer dizer que são bonzinhos para avisar ao
consumidor de que ele não deve solicitar um empréstimo que o seu bolso não possa alcançar ou que aquele carro ele pagará mil vezes, ou que o consumidor
tem que tomar cuidado com o mercado de consumo uma vez que o fornecedor
constrói armadilhas com dissimulações levando ao cliente a bancarrota.
O pior. O
CONSUMIDOR não conhece seus direitos e não sabe que ele pode ESCOLHER e não é obrigado
a suportar nada que o FORNECEDOR exija.
O Consumidor
muitas vezes não tem conhecimento de que estando o seu nome na SERASA e SPC, tem que
sair AUTOMATICAMENTE dos CADASTROS após 5 anos.
Mas, mesmo não estando mais o nome "sujo", quando ele
vai solicitar um novo crédito as empresas trazem em seus bancos de dados a vida
pregressa deste consumidor que continua com restrições, o que conforme o CDC já
deveria ter saído.
Portanto, esses 5
anos não se trata de PRESCRIÇÃO de dívidas, e sim, PRESCRIÇÃO da ação que o
CREDOR pode ajuizar contra o DEVEDOR no caso de dívida (dentro desses 5 anos). Assim o fornecedor só pode ajuizar ação
dentro desses 5 anos. O nome do consumidor é que tem que sair em 5 anos.
7.
PRESCRIÇÃO
DA AÇÃO DO FORNECEDOR CONTRA O CONSUMIDOR
E, por final, temos o § 5º - Consumada
a prescrição relativa à cobrança de débitos do consumidor, não serão
fornecidas, pelos respectivos Sistemas de Proteção ao Crédito, quaisquer
informações que possam impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos
fornecedores.
Se o nome do
Consumidor deveria sair após os 5 anos, nenhuma empresa poderia dizer que não
vai fornecer o crédito. Mas essa não é a realidade. Existe o controle dos
órgãos cadastrais que impede o consumidor de ter novo crédito. Mas, como já
mencionei, na normalidade esse Consumidor que está aqui é aquele que não agiu com má-fé, isto
é, não é aquele que agiu propositalmente. Houve um descontrole. Não é aquele que passou diversos cheques
sem fundos por ser realmente um mau pagador.
O Consumidor vai
a uma empresa e dizem que o seu perfil não adequa, ou que tem restrições. Mas,
se o CDC diz que não pode impedir de novo crédito, como podemos resolver isso.
Tem diversos
julgados que determinaram as empresa de fornecer novo crédito e dentre elas
observemos abaixo uma decisão da justiça da 5ª região (Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Sergipe).
JULGADO:
CAIXA ECONÔMICA FEDERAL NÃO PODERÁ NEGAR
CRÉDITO A INADIMPLEMENTO HÁ MAIS DE CINCO ANOS.
Clientes que deixaram de pagar empréstimos há
mais de cinco anos não poderão ter o crédito restringido pela caixa econômica
federal.
Por unanimidade, a terceira turma do tribunal
regional federal da 5ª região (TRF-5) determinou que qualquer informação negativa
de correntistas inseridas em cadastro ou banco de dados interno antes desse
prazo não pode ser usada na concessão de empréstimos e financiamentos.
A decisão é válida para todo o país e tem como
base o código de defesa do consumidor. A legislação, de acordo com o tribunal,
estabelece que os cadastros de consumidores não podem conter informações
negativas de mais de cinco anos e garante acesso a esses dados pelos clientes.
O Ministério Público Federal, autor da ação,
alega que essa norma tem como objetivo impedir que o consumidor seja
eternamente punido por fatos antigos, o que configura pena de caráter perpétuo,
proibida pela constituição federal.
O processo teve origem na 8ª vara da justiça
federal no Ceará, que condenou o banco em primeira instância. A caixa recorreu
no TRF-5, onde também perdeu a ação, mas decidiu contestar novamente a sentença
por meio de embargos de declaração.
Para o TRF-5, a decisão não prejudica os
riscos de negócio da caixa, porque a instituição pode continuar a avaliar o perfil,
a renda e o endividamento do cliente, desde que não sejam considerados dados de
mais de cinco anos.
8.
CONCLUSÃO
Concluímos que a SERASA e SPC acusam, julgam e
condenam ao Consumidor a prisão perpétua e, como disse o MP na decisão do
TRIBUNAL do Ceará, prisão de caráter perpétua é proibida pela Constituição da
República.
Reflitam o dispositivo a seguir da Constituição e
tirem suas conclusões:
Art. 5º inciso
XXXVII da Constituição da República:
"não haverá juízo ou tribunal de exceção".
O que é um Tribunal de exceção?
O que é um Tribunal de exceção?
O primeiro e mais claro é que eles invariavelmente não são imparciais, uma vez que a sua criação é direcionada para um caso específico. Ou seja, só é criado um tribunal de exceção quando há algum interesse na direção das decisões e do resultado.
Outro problema é que a pessoa, ao ser julgada por um tribunal de exceção, perde algumas das outras garantias do processo, como a do duplo grau de jurisdição e do juiz natural, por exemplo. E não necessariamente o tribunal é formado por juristas, podendo ser composto por qualquer pessoa, para julgar qualquer caso, contra qualquer pessoa. É uma boa forma de se acabar com a segurança jurídica.
Por isso, os tribunais de exceção, em sua grande maioria, são expressões de países totalitários ou formas de repressão pública de alguns indivíduos “desviados” ou que, aos olhos da população, mereçam severa repreensão (como os nazistas de Nuremberg).
Pergunto. Condiz com o
Estado Democrático de Direito?
Rachel
Brambilla
Professora de
Direito do Consumidor e Direito Comercial
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